Rev. Angus Stewart
Os inimigos das doutrinas da graça são Pelagianismo, Semi-Pelagianismo, Sinergismo, Arminianismo, Amiraldianismo, etc. Mas existe um outro inimigo … apatia. Existem aqueles que podem conceder que essas doutrinas são verdadeiras mas que não tem coração para elas. As doutrinas da graça não são essencias, eles dizem, e a sua importância na pregação e catequismo são questionadas. Não podemos somente pregrar o evangelho “simples”?
A Confissão de Westminster e Catecismos são, claro, de uma mente diferente, como são as Três Formas de Unidade, especialmente os Cânons de Dordt. A Soberana Graça de Deus foi a razão pela qual os Reformadores se separaram da apóstata Igreja Romana. Os pré-Reformadores, Wycliffe e Hus, proclamaram Deus como o Salvador Soberano. No século nove, Gottschalk apodreceu na prisão por quase vinte anos pela verdade da dupla predestinação. Antes disso, Agostinho, no quinto século, firmemente ensinou a poderosa graça de Deus.
Este ensino da soberania de Deus é tirado, claro, da Santa Escritura. Este é ensinado de Gênesis à Apocalipse com o apóstolo Paulo sendo preeminente, como Agostinho coloca, “o pregador da graça”.1 Em suas cartas ele inculca essas doutrinas nas igrejas (particularmente Romanos, Efésios e I Tessalonicensses) e a segunda epístola canônica de Paulo à Timóteo é também instrutiva à este respeito.
O apóstolo está preso em uma cela Romana (1:8) e preso como um criminoso (1:16; 2:9). Ele, evidentemente, está com frio e com falta de bom material para leitura (4:13). Ele não tem ilusões; ele sabe que será executado: “Porque eu já estou sendo oferecido, e o tempo da minha partida está próximo” (4:6). Ele não tem remorsos de tortura de alma: “Combati o bom combate, acabei a carreira, guardei a fé” (4:7). Para ele o viver tem sido Cristo e, agora, morrer seria ganho: “Desde agora, a coroa da justiça me está guardada, a qual o Senhor, justo juiz, me dará naquele dia” (4:8).
Paulo era um homem de previsão e visão. Ele, o apóstolo e doutor dos Gentios (1:12), estava para passar para outro mundo. Como um mestre construtor sábio, ele iria usar suas últimas cartas para guardar contra a intrusão de madeira, feno e palha sobre a fundação de Jesus Cristo (I Coríntios 3:11-12). O que estava em jogo era a preservação da igreja de Cristo e a continuação do evangelho neste mundo perverso. Já havia apostasia na Ásia (Turquia nos dias de hoje) e hereges tinham surgido (II Tim. 1:15; 2:17-18). Paulo sabia que o reino messiânico não impediu o poder do mal na presente era (3:1-13). Nas congregações Cristãs, o tempo virá, disse ele à Timóteo, quando eles “não suportarão a sã doutrina; mas, tendo comichão nos ouvidos, amontoarão para si doutores conforme as suas próprias concupiscências” (4:3-4).
Paulo escreveu à Timóteo para cingí-lo com força para a batalha (2:3) e exortá-lo à perseverança no evangelho (1:13-14; 3:14). A luta seria grande, a verdade seria atacada e todos os piedosos seriam perseguidos (3:12). Haveria tentação de “aparar” o evangelho, para derrubar suas arestas a fim de ganhar mais aceitação mas “o modelo das sãs palavras” deveria ser conservado (1:13). Timóteo havia passado muito tempo com Paulo, e Paulo, claro, sabia que Timóteo estava convicto da verdade do evangelho. Na sua última carta, o inspirado apóstolo ressaltaria estas coisas para Timóteo e para toda a igreja Cristã.
Paulo cumprimenta seu irmão mais novo na fé com grande afeição em Cristo, assegurando-lhe de suas orações e do desejo de vê-lo (1:1-5). Ele o incita a zelar pelo evangelho (1:6f.). A salvação de Deus tem sua fonte em Seu eterno propósito (1:9), é manifestada na incarnação e na vitoriosa ressureição de Cristo (1:10), e é pregada as nações (1:11). A expiação de Cristo e a pregação da igreja são eficazes e poderosas (1:8) para aqueles eternamente amados nEle. Nossa salvação e chamado são de acordo ao propósito gacioso de Deus “antes dos tempos dos séculos” (1:9). O decreto de Deus para salvar é efetuado por meio da cruz de Cristo (1:9-10). Esta era a mensagem que o apóstolo pregou e ensinou aos Gentios (1:11). O eleito ouvia a pregação e era salvo “pela fé que há em Cristo Jesus” (3:15). Essa salvação era totalmente de Deus, “Que nos salvou, e chamou com uma santa vocação” (1:9). Paulo, para tornar impossível todos os conceitos errados, adiciona, “não segundo as nossas obras” (1:9). Não é de admirar que o apóstolo não se envergonhasse (1:12) e que Timóteo também não deveria (1:8). Deus concede sua graça e Espírito Santo àqueles eternamente escolhidos em Cristo (1:6-7,9).
Este evangelho, “o modelo das sãs palavras”, em toda a sua riqueza e em toda a sua parte, deve ser conservado (1:13). No entanto, esse evangelho também traz aflição e pode ser guardado somente em fé e amor pelo Espírito Santo, o poder de Deus, que habita em nós (1:7, 13-14).2 Ele é quem trabalha a salvação de Cristo em nós, e Ele é quem deve preservar Sua palavra em nossos corações. Figelo e Hermógenes eram (interiormente) estranhos à essa graça e apostataram (1:15), mas Deus tinha sido fiel na linha da aliança de Timóteo (1:5) e tem sempre preservado Sua igreja (1:3).
Este evangelho era para ser mantido por Timóteo: “Tu, pois, meu filho, fortifica-te na graça que há em Cristo Jesus” (2:1). Paulo também estava preocupado com o futuro da igreja. As gerações vindouras devem ouvir o evangelho puro: “E o que de mim, entre muitas testemunhas, ouviste, confia-o a homens fiéis, que sejam idôneos para também ensinarem os outros” (2:2). Esta é a verdadeira sucessão apostólica.
O apóstolo pregou seu “Calvinismo” (para usar um anacronismo); ele não apenas disse que mantinha essas verdades.3 Além disso, seu “Calvinismo” influenciou e governou a maneira que ele trabalhava. Portanto, em seu sofrimento, ele era confortado em seu conhecimento de que Seu Pai gracioso, que era Soberano sobre todas as coisas, havia ordenado elas como meios para salvação dos Seus eleitos (2:8-10).
Da mesma forma, a soberania de Deus na salvação era sua consolação e âncora quando Cristãos professos erravam na doutrina. Himeneu e Fileto ensinaram uma visão herética da ressurreição e alguns os seguiram (2:17-18). O apóstolo sabia que, em tudo isto, Deus preservaria Seu povo porque “o fundamento de Deus fica firme, tendo este selo: O Senhor conhece os que são seus” (2:19).
Isto, claro, não levou a uma negligência pecaminosa em Paulo porque ele imediatamente exorta, “e qualquer que profere o nome de Cristo aparta-se da iniquidade” (2:19), antes de dar vários comandos (2:20-23) e explicar como instruir aqueles entrincheirados em erro (2:24-26). O apóstolo exorta o ministro Cristão, como “servo do Senhor”, à gentileza, paciência e mansidão, de acordo com as doutrinas da graça (2:24-25). O “oponente” é para ser visto como se opondo primeiramente a si mesmo ao invés do pastor (2:25), pois ele é enredado pelo diabo (2:26). Seu “arrependimento para conhecer a verdade” é totalmente dependente da vontade do Todo-Poderoso (2:25).
As doutrinas da escravidão da vontade (2:26) e da soberania de Deus na salvação (2:25), ao invés de serem um obstáculo ao verdadeiro evangelismo, são, antes, suas pressuposições cruciais.4 A soberana graça de Deus e a responsabilidade do homem em obedecer ao Deus vivo e verdadeiro estão entrelaçadas em II Timóteo. A verdade da graça de Deus tem de ser mantida, confessada e pregada na igreja.5 Paulo comandou Timóteo e, de fato, todos os ministros Cristãos: “Conjuro-te, pois, diante de Deus, e do Senhor Jesus Cristo, que há de julgar os vivos e os mortos, na sua vinda e no seu reino, que pregues a palavra, instes a tempo e fora de tempo, redarguas, repreendas, exortes, com toda a longanimidade e doutrina” (4:1-2).
Assim como ele abriu sua carta a Timóteo com graça (1:2), Paulo fecha escrevendo, “O Senhor Jesus Cristo seja com o teu espírito. A graça seja convosco. Amém” (4:22).
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1 Augustine, The Enchiridion on Faith, Hope and Love (Chicago, IL: Henry Regnery Company, 1961), xxxii; p. 39.
2 Interessantemente, as três ocorrências da palavra, “evangelho”, em II Timóteo, estão todas lincadas a sofrimento: “participa das aflições do evangelho segundo o poder de Deus” (1:8); “pelo evangelho; para o que fui constituído pregador, e apóstolo, e doutor dos Gentios. Por cuja causa padeço também isto” (1:10-12); “segundo o meu evangelho; por isso sofro trabalhos e até prisões, como um malfeitor” (2:8-9).
3 Aqui, o apóstolo é um exemplo de todos os ministros do evangelho. Agostinho, aquele fiel seguidor de Cristo, “foi muitas vezes acusado de pregar a doutrina da predestinação muito livremente” (John Calvin, Institutes 3.21.4).
4 Olhando para a depravação do homem, fora da graça de Deus, no próximo capítulo (3:1-9, 13), nós vemos que ninguém jamais seria salvo senão somente pela graça eficaz.
5 1:6-8, 13-14; 2:1-3, 14-16, 23-26; 3:14-17; 4:1-5.
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