Herman Hoeksema
Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto
Contudo, tão logo apresentamos a questão do pacto dessa forma – se a vida do pacto em Deus é uma vida da mais perfeita amizade, da mais íntima comunhão, do mais profundo conhecimento e do mais afetuoso amor – então se segue que a idéia do pacto não pode ser encontrada num acordo ou contrato. Com perfeita harmonia e comunhão de vida, com o conhecimento perfeito e eterno de um para com os outros, e com o mais perfeito amor e unidade, a idéia de um acordo ou a conclusão de um pacto não se encaixa. Em tal relação tudo é espírito e vida. A idéia do pacto é dada com a vida do Deus triúno em si mesmo. Ela surge na espontaneidade eterna a partir da essência divina e se concretiza com perfeita consciência divina nas três pessoas. Deus conhece e deseja a si mesmo, ama e busca a si mesmo eternamente como o Deus pactual. O pacto é o laço de Deus consigo mesmo. É a vida eterna de luz perfeita.
Se isso é assim no próprio Deus, deve ser também aplicável à idéia pactual como uma relação entre Deus e o homem. Porque todas as coisas são somente procedentes de Deus, por meio dele, e para ele, a relação pactual também nunca pode ser algo que não um reflexo ectípico da vida pactual no próprio Deus. Se a essência do pacto em Deus é a comunhão de amizade, essa deve ser também a essência do pacto entre Deus e o homem. Se essa comunhão de amizade em Deus reside sobre sua perfeita unidade essencial por distinção pessoal, então esse deve ser também o caso com o pacto entre Deus e o homem: ele deve ser também baseado sobre uma semelhança criatural do homem a Deus por distinção pessoal. Se essa comunhão de amizade na Trindade implica um conhecimento perfeito de um ao outro, então a vida pactual do homem também deve consistir em conhecimento e comunhão: Deus se revela ao homem, faz com que o homem o conheça, revela seus segredos a ele, fala com ele como um amigo com o seu amigo, anda com ele, come e bebe com ele, e vive com ele sob o mesmo teto. Se a vida pactual em Deus consiste na unidade das três pessoas da santa Trindade no laço de perfeito amor, então a relação pactual entre Deus e o homem também deve se originar em Deus abrindo o seu coração para o homem.
Então a vida do pacto é a própria vida eterna. “E a vida eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste. Eu neles, e tu em mim, a fim de que sejam aperfeiçoados na unidade” (João 17:3, 23). Como a versificação holandesa do Salmo 25:7 traz, “God’s verborgen omgang vinden Zielen, daar Zijn vrees in woont; ´t Heilgeheim wordt aan Zijn vrinden, Naar Zijn vreeverbond, getoond.” Então o pacto é a própria essência da religião, o mais alto bem, a melhor coisa que pode ser transmitida ao homem através da graça, a maior bem-aventurança. A idéia do pacto certamente não é de um contrato ou acordo, quer você conceba tal acordo num sentido unilateral ou bilateral. O pacto é a relação da mais íntima comunhão de amizade, na qual Deus reflete sua vida pactual em sua relação com a criatura, dá a essa criatura vida, e faz com que ela prove e reconheça o mais alto bem e a fonte abundante de todo o bem.
Fonte: Reformed Dogmatics, Herman Hoeksema, Reformed Free Publishing Association, vol. 1, pp. 458-460.
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