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As Qualificações dos Diáconos (1): Um Assunto Importante

Douglas J. Kuiper

Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto1

No momento em que você ler este artigo,2 muitas das nossas Igrejas Protestantes Reformadas terão novos diáconos instalados. Por dois ou três anos esses homens, crendo terem sido chamados pelo próprio Deus para o ofício, se devotarão à obra de administrar as misericórdias de Cristo aos pobres e necessitados. Que chamado pesado!

A questão é: que tipo de homens tem sido colocado nesse ofício? Concílios e congregações, que tipo de homens vocês nomeiam e elegem? Diáconos, que tipo de homens vocês são em toda a sua vida?

Um grande perigo para as igrejas e crentes é que começamos a formar nossas próprias idéias de qual tipo de homens é mais capaz de servir no ofício da igreja. Nossa natureza nos levaria a nomear ou votar naqueles de quem mais gostamos, ou com quem mais nos relacionamos; ou num bom administrador que pensamos ser mais bem equipado para manusear nosso dinheiro; ou alguém que busque coisas (coisas terrenas, espirituais mas não-essenciais, ou qualquer outra coisa) da nossa maneira.

Contudo, é errado seguir a direção da nossa natureza ao nomear ou votar em diáconos. É ignorar o fato que a igreja é a casa de Deus, isto é, a casa que Deus redimiu por meio de Cristo, e a casa na qual Deus é o senhor. É ignorar o fato que no final das contas é Deus quem determina quem servirá como despenseiro das misericórdias de Cristo em sua casa. É ignorar a vontade de Deus, apresentada em 1 Timóteo 3:8-12, considerando quem pode servir no ofício. O resultado de ignorar todas essas coisas é que escolhemos homens para servir no ofício da igreja da mesma forma que a sociedade secular seleciona homens para servir em posições do governo.

Concílios, vocês nomeiam homens que são verdadeiramente qualificados, de acordo com as qualificações encontradas na Palavra de Deus, não é? E membros das congregações, vocês votam naqueles homens que consideram melhor satisfazer o padrão que Deus nos dá, correto? Oro para que seja assim.

Porque o diaconato é um ofício por meio do qual Cristo está presente com a sua igreja, e porque os próprios diáconos devem administrar as misericórdias de Cristo, é imperativo que os diáconos sejam homens qualificados. Deveríamos saber, portanto, quais são as qualificações. Ao tratar esse assunto, começaremos enfatizando a sua importância.

A importância do assunto das qualificações é demonstrada primeiro pelo fato que Deus apresenta na Escritura quais são essas qualificações. Visto que a Escritura é a vontade e a Palavra de Deus, e nossa regra de fé e prática, tudo que é ensinado na Escritura é importante para a igreja e os filhos de Deus. Devemos agir pela Palavra de Deus!

O primeiro lugar no qual a Escritura apresenta as qualificações dos diáconos é Atos 6:3, 5, parte do registro da instituição do ofício. Os apóstolos direcionaram a igreja a selecionar sete homens para a obra do diaconato, de acordo com o versículo 3: “Mas, irmãos, escolhei dentre vós sete homens de boa reputação, cheios do Espírito e de sabedoria, aos quais encarregaremos deste serviço.” Um dos homens a quem a igreja escolheu foi “Estêvão, homem cheio de fé e do Espírito Santo” (v. 5). Os apóstolos entenderam a necessidade de se ter homens qualificados para o serviço, e sabiam que a qualificação principal era a pessoa ser cheia do Espírito Santo. Para a instrução da igreja nos anos seguintes, a Escritura registra que esses requerimentos foram seguidos. Estevão em particular foi um homem eminentemente qualificado. A igreja naquelas dias entendeu a importância de um diácono ser qualificado.

A Escritura apresenta as qualificações em maior detalhe em 1 Timóteo 3:8-12: “Semelhantemente, quanto a diáconos, é necessário que sejam respeitáveis, de uma só palavra, não inclinados a muito vinho, não cobiçosos de sórdida ganância, conservando o mistério da fé com a consciência limpa. Também sejam estes primeiramente experimentados; e, se se mostrarem irrepreensíveis, exerçam o diaconato. Da mesma sorte, quanto a mulheres, é necessário que sejam elas respeitáveis, não maldizentes, temperantes e fiéis em tudo. O diácono seja marido de uma só mulher e governe bem seus filhos e a própria casa”.

Ao escrever essas palavras, e ao escrever anteriormente sobre as qualificações dos presbíteros, o inspirado apóstolo Paulo pretende enfatizar para o jovem pastor Timóteo a importância dessas qualificações. Homens que não satisfaçam esses requerimentos não podem ser postos no ofício de diácono na igreja. Paulo diz nos versículos 14-15, “Escrevo-te estas coisas, esperando ir ver-te em breve; para que, se eu tardar, fiques ciente de como se deve proceder na casa de Deus, que é a igreja do Deus vivo, coluna e baluarte da verdade”.

Como proceder na casa de Deus – um assunto deveras importante!

Uma segunda forma na qual a importância dessa questão pode ser mostrada, e novamente a partir da própria Escritura, é observar que quando a Escritura fala explicitamente do ofício do diácono, ela diz muito pouco sobre a obra do diaconato, colocando ao invés disso a ênfase sobre as qualificações dos diáconos.

Sem dúvida, ninguém argumentaria que o tipo de obra que os diáconos fazem não é importante. Nem é o caso que a Escritura não diz nada sobre tal obra. Atos 6:1-2 diz que esses sete homens deveriam “servir às mesas”, isto é, cuidar das viúvas na “distribuição diária.”3 Romanos 12:8, 1 Coríntios 12:28, e outras passagens falam sobre a questão da obra do diácono. Mas quando a Escritura indica claramente que está dando instrução com respeito ao ofício do diácono, como o faz em Atos 6:1-6 e 1 Timóteo 3:8-13, essa instrução toma a forma de nos ensinar quais são as qualificações para o ofício. Certamente Deus também vê a obra do diácono como importante, mas ele parece estar imprimindo sobre nós que está tão preocupado, se não mais, com que tipo de homens eles são! O tipo errado de homem tentando fazer a obra do diaconato não será uma bênção para a igreja!

À luz da ênfase da Escritura sobre as qualificações, e não sobre a obra do ofício, notamos com interesse que nossas confissões Reformadas enfatizam exatamente o oposto. Elas falam sobre a obra do diaconato, e a maneira de chamar os diáconos, mas diz mui pouco sobre a questão das qualificações.

Nossa Confissão Belga,4 a única das nossas Três Formas de Unidade5 que menciona o diaconato, apresenta brevemente a obra dos diáconos e a importância geral do diaconato. Sua única menção das qualificações é encontrada na sentença conclusiva do Artigo 30, e aplica-se também aos presbíteros e pastores: “Desta maneira, tudo procederá, na igreja, em boa ordem, quando forem eleitas pessoas fiéis, conforme a regra do apóstolo Paulo na carta a Timóteo”.

A Ordem da Igreja6 não diz nada sobre as qualificações necessárias dos diáconos, mas explica como os diáconos devem ser escolhidos para o ofício, e qual é a obra deles.

A Forma de Ordenação de Presbíteros e Diáconos7 fala primariamente da obra deles. Em quatro lugares, a Forma implica, mas não declara especificamente, que os diáconos devem ser homens qualificados. A primeira questão colocada para os presbíteros e diáconos é: “vocês sentem ou não em seu coração que foram fielmente chamados pela igreja de Deus, e conseqüentemente pelo próprio Deus, para seus respectivos ofícios santos?” O sentimento no coração de alguém de que ele é alguém fielmente chamado, e especialmente chamado de Deus, implica que o diácono-eleito examinou o seu coração, a fim de verificar se está qualificado para a obra. A terceira pergunta questiona, em parte, “vocês também prometem andar em toda a piedade…” Piedade – isso, em resumo, é o que é requerido do diácono de acordo com 1 Timóteo 3:8ss. Na seção de exortação, a Forma cita, sem mencionar, 1 Timóteo 3:9,13. A forma diz, “… e conservar o mistério da fé com uma consciência pura… Ao assim fazer, vocês alcançarão para si mesmos uma boa posição e muita intrepidez na fé que há em Cristo Jesus…” Embora Paulo tenha escrito essas palavras com respeito aos diáconos, a Forma aplica isso aos presbíteros também! Finalmente, com respeito à Forma, a oração inclui petições para que os dons espirituais de Deus venham sobre eles, a fim de poderem desempenhar o seu trabalho. A igreja agradece ao Senhor que “Tu tens no presente nos concedido neste lugar homens que são de bom testemunho, e, confiamos, dotados pelo teu Espírito. Te suplicamos, enche-os mais e mais com tais dons, na medida em que forem necessários para eles em sua ministração – com dons de sabedoria, coragem, discrição, e benevolência, a fim de que todos possam, em seus respectivos ofícios, se portarem como é conveniente…” Ora-se por dons importantes, mas somente por implicação alguém pensa nas qualificações apresentadas em 1 Timóteo 3.

Em minha visão, esse silêncio relativo das nossas confissões sobre as qualificações do diaconato enfatiza ainda mais a importância das qualificações escriturísticas em 1 Timóteo 3. A Confissão Belga chama explicitamente a atenção para essa importância. O silêncio de outras confissões sobre o assunto indica que o ensino da Escritura é claro. As confissões falam sobre áreas nas quais precisamos mais direção específica, pois a Escritura dá apenas princípios amplos com respeito à obra e ao chamado dos diáconos. Com respeito a suas qualificações, contudo, os princípios da Escritura não são amplos; são diretos e específicos. A igreja não precisa de nenhuma direção confessional aqui. Deus terá apenas homens que se encaixem nas qualificações de 1 Timóteo 3:8 como sendo diáconos em sua igreja!

A igreja fiel tem sempre considerado esse assunto de qualificações apropriadas dos diáconos como sendo importante. Não escrevi que “a igreja” sempre considerou isso importante, pois não o fez; quando a igreja se tornou infiel à Palavra de Deus, ela perdeu seu senso da importância dos requerimentos de Deus quanto a um diácono em 1 Timóteo 3:8ss. Mas a “igreja fiel,” sendo fiel à Palavra de Deus, via e vê a Palavra de Deus em 1 Timóteo como importante. Umas poucas notas históricas sobre a visão da igreja sobre esse assunto serão suficientes para demonstrar isso.

Na era pós-apostólica, quando a igreja ainda era bastante forte, ela guardou em mente os requerimentos de 1 Timóteo 3. Peter Y. DeJong refere-se a pelo menos três documentos para substanciar essa afirmação. O Didaquê, escrito em aproximadamente 98 d.C., diz: “Escolha bispos e diáconos dignos do Senhor. Eles devem ser homens mansos, desprendidos do dinheiro, verazes e provados…”8 Perto do fim do segundo século, as Constituições Apostólicas foram escritas, que requeriam que os diáconos fossem provados, exemplares na conduta, e tivessem uma família com filhos. O Livro de Clemente também indica que 1 Timóteo 3 era seguido.9

O declínio do diaconato começou no século quatro, e durou até o período da Reforma. Um aspecto do declínio do diaconato foi que as qualificações para o ofício foram mudadas ou ignoradas.10

João Calvino enfatizou a necessidade dos diáconos serem qualificados.11 Em Londres, John Lasco fez a mesma coisa.12

Hoje, também, igrejas fiéis conhecem e procuram seguir os requerimentos de 1 Timóteo 3:8-12, e consideram-nos importantes.

Por que esse assunto é de tão grande importância?

Primeiro, como mencionado, porque é um assunto da Palavra de Deus. Essa é uma razão suficiente. Mas podemos adicionar mais.

Segundo, porque o diácono é o representante de Deus ao seu povo, o representante pessoal de Jesus Cristo para a sua igreja! Ele deve, portanto, ser como Cristo. Desonra seria trazida à igreja e ao ofício se um diácono não fosse um homem piedoso. Lembre-se que pelo pecado de Davi, grande ocasião foi dada aos inimigos do Senhor para blasfemar.

Terceiro, porque Deus concede diáconos. Não meramente os escolhemos; Deus os dá! Como a igreja pode estar certa que esses escolhidos são aqueles por quem Deus a abençoará? Escolhendo aqueles que são qualificados!

Nunca devemos esquecer a grande importância desse assunto. As qualificações apresentadas na Palavra de Deus devem sempre guiar os concílios ao nomear, e membros votantes ao escolher, homens para o diaconato. O dirigente da reunião fará bem em ler 1 Timóteo 3 sempre que o concílio nomear, e em todo encontro congregacional no qual oficiais são eleitos. Aqueles que já são presbíteros e diáconos farão bem em ler o capítulo em casa, nas devoções privadas e na preparação para reuniões vindouras nas quais nomeações serão feitas.

Que possamos proceder corretamente na casa de Deus! E dessa forma, manifestar também nossa fidelidade a ele!


1E-mail para contato: [email protected]. Traduzido em agosto/2007.

2

Artigo publicado em 1 de Março de 2001, na revista The Standard Bearer, volume 77, edição 11. (Nota do tradutor)

3“Ministração diária”, na versão do autor. (Nota do tradutor)

4

Disponível em http://www.monergismo.com/textos/credos/confissao_belga.htm (Nota do tradutor)

5A Confissão Belga, o Catecismo de Heidelberg, e os Cânones de Dort são conhecidos como as três formas de unidade. (Nota do tradutor)

6

Disponível em http://www.prca.org/church_order.html (Nota do tradutor)

7Disponível em

http://www.prca.org/PRC_Confessions_and_Church_Order.pdf (Nota do tradutor)

8Peter Y. DeJong, The Ministry of Mercy for Today, (Grand Rapids: Baker Book House, 1963), página 45.

9Ibid., páginas 46, 47.

10O leitor pode consultar o volume 75, páginas 327-329 da revista Standard Bearer para refrescar sua memória sobre isso.

11Cf. suas Institutas da Religião Cristã, Livro 4, Seção 3, Parágrafo 12.

12Cf. DeJong, op. cit., page 65.

Para material Reformado adicional em Português, por favor, clique aqui.

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