Douglas J. Kuiper
Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto1
Alguém poderia dividir as qualificações para os diáconos, apresentadas em 1 Timóteo 3:8-12, em várias categorias. Algumas das qualificações dizem respeito claramente à situação familiar e vida deles. Eles devem ser “maridos de uma mulher e governar bem seus filhos e suas próprias casas” (v. 12). Além disso, suas esposas devem ser “honestas, não maldizentes, sóbrias e fiéis em tudo” (v. 11). Uma qualificação considera a situação pessoal do diácono com respeito à igreja – ele deve ser “primeiro provado” (v. 10). Algumas dessas qualificações dizem respeito à obra básica da graça de Deus em seus corações – eles devem ser crentes, “guardando o mistério da fé em uma pura consciência” (v. 9). E outras têm a ver com a manifestação dessa graça de Deus na forma como eles vivem – os mesmos devem ser “honestos, não de língua dobre, não dados a muito vinho, não cobiçosos de torpe ganância” (v. 8), e devem ser “irrepreensíveis” (v. 10). Outra qualificação que seria colocada nessa categoria é encontrada em Atos 6:3: “varões de boa reputação.”
É para esse grupo de qualificações que devemos voltar nossa atenção agora. Os diáconos devem ser piedosos em sua conduta! Em como vivem, eles devem manifestar que Deus operou sua graça neles. Devem viver vidas de grata obediência à lei de Deus, e apresentar um exemplo para o povo de tal obediência. Tal vida produzirá respeito do povo da igreja pelos diáconos, e fará com que as pessoas prontamente reconheçam que os diáconos são vasos preparados pela graça para administrar a graça e as misericórdias de Jesus Cristo.
Começamos nosso tratamento da conduta piedosa requerida dos diáconos no último artigo,2 no qual enfatizamos que eles devem ser homens cheios do Espírito Santo, de sabedoria e fé, como foi requerido dos primeiros diáconos na igreja. Que um diácono é cheio do Espírito Santo, de sabedoria e fé será evidente por sua conduta piedosa.
No topo da lista dada em 1 Timóteo 3:8 está o requerimento que os diáconos devem ser honestos. Isso significa que devem ser homens sérios e dignos. A qualificação não diz o que deve ser verdadeiro da disposição natural do homem, mas o que deve ser verdadeiro dele pela graça. Isto é, a Escritura não diz que o homem nunca deve sorrir ou desfrutar de prazeres terrenos; antes, todo esse divertimento apropriado deve ser temperado pela consciência do diácono de três verdades básicas: sua salvação em Cristo é uma maravilha imerecida; o servo de Deus deve ser diligente em tudo de sua vida; e o diácono em particular tem uma grande responsabilidade, que ele deve cumprir fielmente. O que não deve ser verdade do diácono é que ele nunca seja sério, tratando tudo levianamente e com humor.
Tal honestidade e seriedade inspirarão respeito no povo da igreja. Eles entenderão que podem chegar a esses diáconos quando em necessidade, e não serão desconsiderados, ou motivo de outra piada, mas eles e o seu pedido serão tomados seriamente.
Vocês são honestos, diáconos?
Uma pessoa cujas necessidades são legítimas, mas que sente que os diáconos não a tomam seriamente, passará por tempos difíceis sem confiar nos diáconos – seja qual for – novamente.
Seguindo, eles não devem ser de língua dobre. A palavra grega assim traduzida significa, na verdade, “de duas palavras”. Algumas vezes chamamos isso de “duas caras.” Sua palavra a uma pessoa não corresponde com o que diz a outra. Ou, ele faz uma promessa àqueles em necessidade, tentando mostrar compaixão, mas sabendo que não é capaz de cumprir tal promessa.
É aqui que podemos notar o positivo, apresentado em Atos 6:3: “varões de boa reputação.” Que seja ele um homem que obedeça ao nono mandamento sempre.
A segurança e confiança do povo será abalada, não somente nesse diácono particular que não é honesto, mas em todos os diáconos! E como pode um diácono trazer a Palavra de Deus para confortar o povo de Deus em suas necessidades espirituais, quando não pode nem mesmo falar uma palavra de verdade da sua própria boca?
Os comentários de DeJong nesse respeito vão direto ao ponto, e citá-los-ei na íntegra:
Ainda mais que na obra do presbitério, os diáconos estão em sério perigo de cair nesse pecado. Continuamente eles devem entrar em contato com os pobres e necessitados em seus lares, discutir questões pessoais com eles, ouvir a narração de suas circunstâncias e buscar aliviar sua agonia em toda forma possível. Tal obra ardorosa requer não somente um coração simpático e amoroso, mas também um caráter firme e inabalável. Um diácono deve ser capaz de ganhar a confiança daqueles a quem busca ajudar. Esses devem sentir que sua palavra é confiável; que ele não faz promessas que não seja capaz de cumprir. Da mesma forma, ele deve ser capaz de julgar corretamente as situações que obtém, guardar-se de preconceito, e defender quanto possível seu julgamento diante dos outros diáconos e presbíteros a quem é responsável. Qualquer um que faça belas promessas sem autoridade legítima ou antes de ter conhecimento adequado das circunstâncias, se encontrará na posição inevitável de ser acusado de ser indigno de confiança, instável e mesmo enganador.3
A “autoridade legítima” sobre a qual DeJong fala é o corpo de diáconos como um todo; que nenhum diácono, ou comitê de diáconos, faça promessas àqueles em necessidade, exceto promessas que o diaconato como um todo tenha feito. A fim de evitar ser de língua dobre, é também bom que os diáconos saiam em grupos, que discutam de antemão a situação que encontrarão, e que abordem uns aos outros (em privado) se alguém pensa que o outro não tem sido sincero.
Os diáconos também devem ser “não dados a muito vinho.”
O “vinho” é mencionado porque era uma bebida comum naquela época e por causa do seu caráter intoxicador. O diácono deve apresentar um exemplo de temperança e autocontrole para todos. Certamente, ele não pode fazer sua obra como oficial na igreja se Cristo se estiver sob a influência do álcool; para desempenhar tal tarefa, deve ser “cheio do Espírito” (Ef. 5:18).
Historicamente, DeJong aponta, essa admoestação era necessária porque como os diáconos iam de casa em casa recolhendo doações dos ricos, e distribuindo-as aos pobres, frequentemente era lhes oferecido bebida forte.4 Um gole talvez seja excelente. Especialmente em sua casa, um diácono tem a permissão de beber um pouco de vinho. Não queremos estabelecer leis onde a Escritura não o faz; o vinho como tal não é proibido. Mas uma bebida forte em cada casa, quando o diácono visitará vários lares numa noite, é demais!
Hoje, os diáconos devem aplicar o requerimento positivo do autocontrole a mais coisas do que meramente ao vinho. Que os diáconos não sejam dados demasiadamente à comida, ou aos prazeres terrenos, que com moderação são legítimos. Alguém que usa os prazeres terrenos imoderadamente não pode dizer verdadeiramente que coloca as responsabilidades de seu ofício dado por Deus em primeiro lugar na sua vida.
É ainda requerido dos diáconos que eles “não [sejam] cobiçosos de torpe ganância.”
O princípio positivo desse requerimento é realmente o mesmo do requerimento anterior: as coisas terrenas não podem se tornar fins em si mesmos. Isso é verdadeiro também do dinheiro. Esse requerimento se aplica à visão do diácono quanto ao dinheiro: ele deve entender que o mesmo é um meio legítimo pelo qual Deus provê nossas necessidades terrenas, mas ele não pode ser ganancioso ou cobiçoso. Ser bem-sucedido nessa vida, ou rico, não deve ser sua preocupação; ele não deve ser alguém com uma mente governada pelas coisas terrenas. Antes, deve estar contente com sua porção na vida, e ser um exemplo de alguém que confia em Deus para suprir suas necessidades materiais. O requerimento também se aplica à forma na qual o diácono obtém seu dinheiro e possessões – que ele trabalhe honesta e legalmente, e pague um preço justo por aquilo que possui. E o requerimento também se aplica à forma na qual o diácono usa seu dinheiro e possessões – que ele seja um bom despenseiro dele, buscando primeiro as causas do reino. Que esteja certo que traz suas ofertas à Igreja no domingo, e pague sua instituição cristã de ensino, e então cuide das necessidades terrenas de sua família.
Novamente, a importância disso para o diácono é prontamente vista. Primeiro, se os recursos financeiros da igreja serão lhes confiado, ele deve ser um homem que não tenha seu coração posto sobre o dinheiro. Muitas tentações surgirão. Segundo, se ele deve pregar contentamento ao povo que visita, ele mesmo deve praticar o contentamento. E se algumas vezes deve pregar a administração piedosa àqueles cujas necessidades são oriundas da administração pobre deles, o diácono deve estar certo que é também um bom despenseiro.
Por último, com respeito à conduta piedosa do diácono, a Escritura diz que ele deve ser irrepreensível. Essa é a última qualificação mencionada para o diácono, excetuando aquelas que lidam particularmente com sua situação familiar. Com respeito à conduta pessoal do diácono, esse é o ponto conclusivo na Escritura.
A palavra grega traduzida como “irrepreensível” aqui é diferente daquela assim traduzida no versículo dois, com respeito aos presbíteros. Ali a palavra significa literalmente, “não apreendido”, isto é, sua conduta deve ser tal que ninguém possa lançar uma razão para privá-los do ofício, ninguém pode encontrar uma base para uma acusação contra eles. Aqui a palavra tem a idéia de alguém que não pode ser julgado. Vemos que, embora as palavras sejam diferentes, a idéia é substancialmente a mesma.
Diáconos, vocês devem viver assim, em cada aspecto de sua vida – familiar, pessoal, no trabalho, na igreja e no serviço diaconal – para que ninguém tenha alguma razão para acusá-los! Vocês devem obedecer às duas tábuas da lei de Deus, e a todo mandamento, com diligência! E para esse fim, guarde não somente suas ações, mas sua língua também, e seus pensamentos e coração! Vocês devem estar acima de suspeita, e devem se abster não somente do mal como tal, mas de toda aparência do mal.
Isso significa, positivamente, que vocês devem estar próximos de Deus em sua vida, e que isso deve ser evidente em toda a sua vida. Uma pessoa não pode ter tal conduta piedosa sem depender da graça de Deus. Ninguém pode ser verdadeiramente irrepreensível e piedoso enquanto fazendo a obra do diaconato, se não for irrepreensível e piedoso em sua vida pessoal. Seja alguém que gaste tempo com Deus em oração e meditação na sua Palavra todos os dias!
Então vocês podem chegar com ousadia e confiança àqueles em necessidade, como os representantes do Deus vivo e misericordioso, e de Cristo, nosso Sumo-Sacerdote.
Parece que algumas qualificações estão faltando? Onde está a menção do amor e compaixão que um diácono deve ter? Não deveria ser ele um homem que mantém a justiça e é justo? Poderíamos pensar que essas são as qualidades essenciais de um diácono; todavia, a Escritura não faz nenhuma menção explícita delas.
Contudo, essas qualidades estão implicadas nos requerimentos da Palavra de Deus.
Como ele governa seu lar mostrará se tem amor, compaixão e justiça, ou se não possui nada disso. Em seu lar, ele mostra terno amor pelos seus filhos; sua justiça é apropriadamente administrada?
Se ele possui ou não essas qualificações mencionadas mostrará se tem ou não as outras. Ele ama a Deus acima de tudo? Sua obediência à lei de Deus é inabalável? Um homem que ama a Deus amará ao povo de Deus também.
Que ele é honesto e irrepreensível ficará demonstrado em seu amor piedoso e compaixão verdadeira por aqueles em necessidade.
O ponto é esse: que ninguém que não seja honesto, tenha língua dobre, seja dado a muito vinho, e cobiçoso de torpe ganância, alegue ter um amor e compaixão pelo povo de Deus! Tudo o que esses homens mostram é que eles amam as vaidades, as mentiras, o vinho e o dinheiro. E então não podem amar verdadeiramente a Deus e ao seu povo.
Diáconos, vocês são assim [exemplares]?
Esposas, vocês encorajam seus maridos a serem assim?
Presbíteros, diáconos e pastores, vocês se admoestam mutuamente e encorajam uns aos outros para serem assim?
Pessoas da congregação, vocês oram para que seus oficiais sejam homens assim? E vocês os respeitam por serem assim, pela graça de Deus?
Lembre-se que essas qualificações são mencionadas por causa de cada membro da igreja, e não somente por causa do diácono pessoalmente. Devemos todos ficar impressionados com a grande responsabilidade do ofício, e sermos fervorosos em oração, para que Deus possa suprir as necessidades dos nossos diáconos, concedendo-lhes continuamente a graça para serem qualificados, e abençoando-os em seu trabalho.
1E-mail para contato: [email protected]. Traduzido em agosto/2007.
2
As Qualificações dos Diáconos (4): Cheio do Espírito Santo, Sabedoria e Fé
3P. Y. DeJong, The Ministry of Mercy for Today, (Grand Rapids: Baker Book House, 1952), p. 99.
4
Ibid., pp. 99-100.
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