Prof. Herman Hanko
Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto1
“O rei amou a Ester mais do que a todas as mulheres, e ela alcançou perante ele favor e benevolência mais do que todas as virgens; o rei pôs-lhe na cabeça a coroa real e a fez rainha em lugar de Vasti” (Ester 2:17).
Após a última News, o leitor que me fez a pergunta inicial sobre Ester, me enviou material adicional apontando alguns problemas potenciais com minha posição que Ester e Mordecai, seu tio, eram pessoas ímpias a quem Deus usou para salvar a nação de Israel, uma nação da qual Cristo viria. A pergunta sugere a possibilidade que Mordecai era “um homem no centro da libertação dos judeus do genocídio, sinceramente preocupado com a preservação deles (incluindo aqueles que tinham retornado à Canaã).”
Após considerar cuidadosamente as objeções, minha posição básica permanece que tanto Mordecai como Ester eram incrédulos. A questão mais importante permanece: Alguém que ama o Senhor e as promessas feitas a Israel faria o que Mordecai e Ester fizeram? Um crente temente a Deus ordenaria que sua sobrinha entrasse numa competição de beleza patrocinada por um rei pagão, Assuero, especialmente quando a fornicação era um requerimento para a entrada? Um homem que desejasse ser fiel a Deus toleraria as ações de Ester após ela “ganhar” a competição, isto é, casar-se com um pagão divorciado?
A Palavra de Deus ao seu povo, tanto no Antigo como no Novo Testamento, é muito particular sobre o casamento. Os judeus não deviam se casar com alguém de fora da nação, pois seria casar com um pagão incircunciso, e não havia salvação fora da nação de Israel. Alguns gentios, no curso da história de Israel, foram trazidos para a nação (e.g., Raabe, os gibeonitas, Rute, Urias, Araúna, etc.), mas foram incorporados no povo de Deus e se tornaram judeus. Pense, por exemplo, na insistência de Esdras que os homens que tinham se casado com mulheres gentias abandonassem-nas juntamente com as crianças nascidas delas (Esdras 9-10). Isso foi na época do adultério de Ester.
As leis do Antigo Testamento eram igualmente particulares sobre o divórcio e a única exceção que permitia o divórcio estava registrada em Deuteronômio 24 (por causa da “dureza” do coração deles [Marcos 10:5])—uma exceção que Jesus repeliu como irrelevante na nova dispensação (Marcos 10:2-12). Se Mordecai e Ester fossem tementes a Deus, não teriam violado tal lei fundamental.
A fornicação que estava envolvida no concurso de beleza com Assuero, dormindo com cada participante antes de decidir quem seria a nova rainha, foi uma abominação tão grande que é inconcebível pensar que um filho de Deus participaria em tal coisa. Os judeus conheciam as leis que estipulavam que qualquer mulher pega em tal fornicação teria que ser apedrejada.
Uma justificação da conduta de Ester é realmente impossível.
Mas consideremos os pontos específicos levantados por um dos nossos leitores.
(1) “Neemias 7:7 lista um homem chamado Mordecai entre os primeiros a retornarem para Jerusalém. Alguns comentaristas supõem que, se é o mesmo homem, ele pode ter subsequentemente retornado a Susã, por preocupar-se com os judeus que não tinham retornado à terra prometida.”
Ninguém pode determinar com certeza se o Mordecai de Neemias 7:7 é aquele mesmo tio de Ester. Eu duvido muito! Mas mesmo que fosse, o assunto não é essencialmente alterado. Se a preocupação de Mordecai era pelos judeus que não tinham retornado à Canaã, essa preocupação poderia não ter sido uma preocupação piedosa. É verdade que nem todos os judeus que permaneceram em cativeiro eram ímpios. Alguns não podiam retornar por causa de doenças, debilidades, velhice ou, como Neemias, por terem posições no reino das quais não poderiam escapar. Mas um crente israelita quase que certamente teria retornado. O Salmo 137:5 expressa o desejo dos judeus piedosos por Canaã, a terra da promessa: “Se eu de ti me esquecer, ó Jerusalém, que se resseque a minha mão direita”. Essa é uma expressão veterotestamentária do desejo do crente de ir para o céu (cf. Hb. 11:10, 13-16).
(2) “Ester 4:16 descreve Ester como disposta a sacrificar sua própria vida para trazer libertação aos judeus.”
Não penso que a conduta de Ester nessa conjuntura tenha sido um ato nobre. Ela não entregou a situação toda a Deus. Ela não deu qualquer indicação de confiança em sua proteção soberana. Ela não fez nenhuma oração para que a nação fosse poupada por causa da promessa de Cristo. Ela expressou os sentimentos de alguém que vê obrigações necessárias, embora desagradáveis e perigosas, com uma atitude fatalista: “se perecer, pereci” (Ester 4:16). O que há de piedoso nisso? Muitos soldados no campo de batalha dizem a mesma coisa quando estão lutando pelo seu país, e enfrentam situação perigosa na qual podem ser aniquilados. Eles também expressam uma disposição para morrer pelo seu país. O fatalismo não é uma opção para o filho de Deus. Quando os santos confortam uns aos outros, eles não dizem: “Se deve ser, será. Seja bravo. Mantenha o orgulho. Continue. Venha o que vier”. Não consigo ver nada espiritual nessa declaração de Ester, feita sob o incentivo do seu tio.
No próximo artigo, responderemos mais alguns pontos feitos pelo leitor (querendo Deus). Continuemos a “examinar as Escrituras” (João 5:39), e possa o Senhor se agradar em conceder a todos nós um maior entendimento de sua Palavra.
Fonte (original): Covenant Reformed News, Abril de 2007, Volume XI, Edição 12.
1E-mail para contato: [email protected]. Traduzido em março/2007.
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