Prof. Hanko
Um irmão do Brasil pergunta, “Qual era a ideia por detrás da afirmação ou apresentação de Jesus acerca de Si mesmo como o Filho do Homem?”
O nosso Senhor Jesus várias vezes chamava-se pelo nome Filho do Homem. Às vezes até se fica com a impressão que Cristo preferia este nome. Esta impressão advém especialmente do evangelho segundo Lucas, porque o uso do Senhor deste nome para Si mesmo aparece mais frequentemente no registo do terceiro evangelho.
O mesmo nome é frequentemente atribuído ao profeta Ezequiel quando o Senhor lhe deu as profecias que ele deveria falar ao povo em cativeiro.Veja-se por exemplo o verso 2 dos capítulos 33, 34, 35 e 38.Mas como um nome somente para o nosso Senhor Jesus Cristo, ele aparece primeiro em Daniel 7:13-14: “Eu estava olhando nas minhas visões da noite, e eis que vinha nas nuvens do céu um como o filho do homem; e dirigiu-se ao ancião de dias, e o fizeram chegar até ele. E foi-lhe dado o domínio, e a honra, e o reino, para que todos os povos, nações e línguas o servissem; o seu domínio é um domínio eterno, que não passará, e o seu reino tal, que não será destruído.”
Esta visão recebida por Daniel é uma visão de exaltação, ou como podemos chamar, de coroação do nosso Senhor Jesus Cristo. Que ela apareça no Velho Testamento é surpreendente, no entanto ela aparece como profecia, porque a principal tese da profecia de Daniel é o desenvolvimento do Anticristo e o que o Anticristo significa para a igreja. É consistente, portanto, que esta visão da coroação de Cristo apareça em contraste ao Anticristo e como uma profecia da vitória de Cristo sobre o Anticristo e todo o poder das trevas. Nisto o povo de Deus pode encontrar consolo nos terríveis dias em que o Anticristo reina.
É evidente a partir da passagem em Daniel que o nome Filho do Homem é, primeiro e antes de tudo, um nome que pertence a Cristo. A sua importância no Novo Testamento é que o nosso Senhor Jesus Cristo, todo divino, é tão intimamente associado connosco que Ele é também um filho do homem. A Sua genealogia como registada em Lucas vai regredindo até Adão (Lucas 3:23-38)—como a nossa genealogia também faz. Ele nasceu de Maria e era verdadeiramente parte da raça humana. Ele era semelhante a nós em tudo, exceto no pecado.
Esta “semelhança da carne do pecado” (Rom. 8:3) é também importante. A natureza humana de Cristo não era forte, indescritivelmente robusta, imune a todas as fraquezas e doenças, como era a natureza de Adão antes da sua queda. O nosso Senhor veio em semelhança da nossa natureza humana como agora possuímos: fraca e frágil, limitada em poder e sujeita a crescente fraqueza com o passar dos anos, sujeita a todas as doenças e deficiências de qualquer parte dela. Foi essa a natureza humana que Ele tomou sobre Si.
Nós não lemos que o Senhor esteve doente, mas quer tenha ficado quer não, Ele poderia ter apanhado gripe ou pneumonia. Na Sua fraca natureza humana, ele algumas vezes tinha muita fome, algumas vezes muita sede e algumas vezes muito cansaço – como quando Ele adormeceu profundamente num barco em perigo de afundar devido a grandes ondas e poderosos ventos (Mat 8:23-27).
Na igreja antiga, uma heresia se levantou negando a natureza humana enfraquecida de Cristo. Esta heresia (Apolinarianismo) negava que Cristo tinha, como nós, uma alma racional. No lugar de uma alma racional, era reclamado, funcionava um Logos divino. A igreja não quis essa heresia, porque, como dizia um dos pais da igreja, Atanásio, “nós precisamos ser salvos no corpo e na alma e, portanto, o nosso Senhor que veio salvar-nos precisava ter um corpo humano e uma alma humana.”
Muitos dos Anabatistas no tempo da Reforma também negavam que Cristo era semelhante a nós em todas as coisas. Eles reclamavam que o nosso Senhor, apesar de ter nascido da virgem Maria, não possuía realmente uma natureza humana que veio dela; Deus criara a natureza humana de Cristo no ventre de Maria.A ConfissãoBelga repudia essa ideia no Artigo 18. A secção é digna de ser citada: “Em oposição à heresia dos anabatistas, os quais negam que Cristo assumiu um corpo humano de sua mãe, confessamos portanto que Ele participou da carne e sangue dos filhos (Hb 2.14), que Ele é descendente de Davi (At 2.30) segundo a carne (Rm 1.3), fruto do ventre de Maria (Lc 1.42), nascido de mulher (Gl 4.4), renovo de Davi (Jr 33.15), rebento do tronco de Jessé (Is 11.1), procedente de Judá (Hb 7.14), descendente dos judeus segundo a carne (Rm 9.5): da descendência de Abraão, visto que assumiu a descendência de Abraão, tornando-se semelhante aos irmãos em todas as coisas, mas sem pecado (Hb 2.17 e 4.15). assim, Ele verdadeiramente é o nosso Emanuel, isto é, Deus connosco (Mt 1.23).”
A nossa salvação depende da semelhança de Cristo a nós em todas as coisas. O Catecismo de Heidelberg sublinha esta verdade na P. & R. 16: P.16. “Por que tem de ser um homem verdadeiro e justo? Tem de ser homem verdadeiro, pois a justiça de Deus exige que a mesma natureza humana que pecou pague pelo pecado (Rm 5.12, 15; 1Co 15.21; Hb 2.14-16). Tem de ser homem justo pois alguém que, por natureza, já épecador, não pode pagar pelos pecados dos outros (Hb 7.26, 27; 1Pe 3.18).
No nosso tempo de apostasia, as igrejas que negam a divindade de Cristo estão crescendo em número; mas o facto é que a doutrina da plena e complete humanidade de Cristo é também extremamente importante. Não só Cristo precisava ser semelhante a nós em tudo, exceto no pecado, para nos salvar, mas a salvação vem a nós porque nós estamos unidos ao Seu bendito corpo por uma verdadeira e viva fé. Hoje, o nosso maravilhoso Salvador está exaltado nos mais altos céus e resplandecente em majestade como o Rei dos reis e Senhor sobre todas as coisas. Agora, numa gloriosa esperança, nós confessamos que nós iremos, um dia, em corpo e alma, ser como Ele em toda a Sua glória (Fil. 3:21), porque Ele tornou-se como nós para que nós nos tornássemos como Ele (II Cor. 8:9).
Mais um ponto: A aparente preferência do nosso Senhor pelo nome Filho do Homem fala da sua disposição e desejo de ser identificado connosco. Poderemos alguma vez sondar tal humildade? Tal amor? Quão vis somos nós! No entanto o nosso Senhor, num amor sem fronteiras por nós, identifica-se connosco e torna-se como nós. Gloriosa verdade!
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